A pandemia provocou profundos impactos em nossas rotinas, no qual, de uma forma muito rápida e abrupta, vimos nosso dia a dia mudar profundamente. Na vida das crianças, de um modo especial, elas se viram restritas em seus contatos sociais, onde deixaram de ter o convívio com pessoas importantes ao seu redor, como avós, tios, primos, entre outros parentes, além dos amigos e professores, tendo que se acostumar a encontrá-los via chamadas de vídeo.
A escola, um dos ambientes mais importantes para o desenvolvimento social dos pequenos também ficou distante, e, este grande espaço com mesas, cadeiras, lousas e professores, se converteu a uma sala ou um quarto da própria casa da criança, tendo seus pais como professores.
Mas e o brincar? Este também foi afetado, por seus espaços e relações. Muitas possibilidades ficaram limitadas. Logo, muitas mudanças sobre as quais as crianças têm dificuldade para compreender o seu porquê começaram a ser questionadas por eles mesmos, uma vez que, por estarem ainda em desenvolvimento, não dispõe das condições cognitivas e afetivas para tal.
Frente a este cenário, é importante dedicarmos atenção a todo este contexto, haja vista que elas podem afetar o desenvolvimento das crianças em muitas dimensões, como a cognitiva, a afetiva, a social ou a psicomotora, por exemplo. Muitos estudos têm sido desenvolvidos com a finalidade de avaliar os impactos da pandemia sobre o desenvolvimento infantil, mas, o ponto comum entre eles indica que as consequências estão, direta ou indiretamente, relacionadas ao estresse provocado pelas condições de distanciamento que a pandemia impôs ante a necessidade de contenção da propagação do vírus.
Uma pesquisa importante vem sendo desenvolvida pelo Núcleo de Ciência pela Infância, do qual a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo faz parte. Neste estudo, os pesquisadores apontam que o distanciamento social tem provocado impactos significativos sobre o comportamento e o desenvolvimento infantil, das quais, destacam-se a dependência excessiva dos pais, desatenção, preocupação, alterações no sono e apetite, pesadelos, desconforto e agitação.
Esses sintomas têm sido provocados pelo estresse ocasionado nas crianças em função das novas configurações e dinâmicas impostas pela pandemia e do isolamento social que tem sido vivenciado como eventos ameaçadores a elas. Isso significa dizer que não somente pelas ameaças e incertezas de vida, saúde e estabilidade sócio-econômica as crianças têm sofrido, mas, inclusive, pela forma como as relações sociais e o uso dos espaços começaram a se redefinir. A exemplo, temos visto o aumento expressivo dos casos de violência intrafamiliar em detrimento de uma convivência em maior tempo junto aos agressores.
Não podemos deixar de destacar que alguns eventos aqui citados, como por exemplo, a violência intrafamiliar, mesmo antes da pandemia, já eram apontados como fatores que afetam o desenvolvimento infantil a curto, médio e longo prazo em suas distintas dimensões, podendo trazer danos severos a elas. A precariedade nas condições sócio-econômicas, igualmente, pode afetar a oferta de condições de alimentação, saúde e higiene adequadas e necessárias ao desenvolvimento.
Ainda que o fechamento das escolas tende a acentuar a fragilidade deste cenário, haja vista que elas se constituem como importante rede de apoio social das famílias e como espaços de aprendizagem, convivência, alimentação e lazer para as crianças. Exatamente por isso, temos visto casos de crianças enfrentando dificuldades na concentração, desenvolvendo inquietação, alterações no sono, alimentação e humor ou experienciando o medo, a ansiedade, estresse, tédio e até mesmo solidão.
Logo, precisamos pensar nas possibilidades de ação/intervenção junto às crianças para que seu desenvolvimento social e intelectual não venha ser afetado/traumatizado por circunstâncias que muitas vezes estão em nossas vistas, porém, as deixamos de lado por causa de nossas rotinas atribuladas, acarretando a falta de atenção, de conversar, de brincar e de ensinar.
Sobre Helen Tatiana dos Santos Lima
Psicóloga e professora da Estácio Brasília, Helen é licenciada em filosofia e especialista em educação inclusiva e psicologia escolar, sendo mestre e doutora em educação, além de ser formada na Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação (EAPE) da Secretaria de Educação do Distrito Federal.