O espetáculo teatral Hiato nasce da necessidade de jogar luz em temas coletivos importantes neste início de século. Em tempos de hiperconectividade e superestimulação, a humanidade enfrenta uma epidemia dos casos de depressão, ansiedade, superaquecimento (ou síndrome de burnout) e suicídio. O tema central do espetáculo é a saúde mental.
Em Hiato, o ator e dramaturgo Arthur Tadeu Curado, ao lado da atriz e bailarina Larissa Salgado e da diretora Andréa Alfaia, propõe dar voz a alguns personagens para que possam falar da relação com a ideia da desistência, de como foram afetados pela competitividade e pouca interação social.
Em cena, pessoas que são afetadas pelo que é agora conhecido como “doenças do desespero” elaboram suas causas, oferecem seus porquês e justificam seus atos/escolhas. A ideia é discutir as questões da alma humana embebida na contemporaneidade líquida.
Arthur Tadeu Curado, dramaturgo brasiliense, tem em seu currículo textos reconhecidos e premiados nacionalmente, como “Dois de Paus” (que ficou em cartaz por 7 anos, foi visto por mais de 500 mil espectadores e percorreu 25 estados do país e teve montagens realizadas por outros grupos teatrais brasileiros) e o popular “Complexo de Cinderela” (10 anos em cartaz em diversas versões diferentes). Escreveu ainda “História Redonda Sobre O Nada”, que teve montagem em Buenos Aires no Espaço Cultural Konex, “Existe Alguma Coisa Entre Nós” e “Bem Perto Do Fim”. Traduziu e dirigiu “Muito Barulho Por Nada”, de Shakespeare, em 2014-15 e atuou em “Meu Caio”, biografia teatral do escritor gaúcho Caio Fernando Abreu e “Uma Criatura Dócil”, de Dostoievski, em cartaz no teatro Eva Hertz, da Livraria Cultura, em 2016-17.
A escolha por janeiro para a estreia de “Hiato” nasce da vontade da equipe em contribuir com o “Janeiro Branco”. Campanha que visa conscientizar, discutir e iluminar questões de saúde mental. “Todos precisam aprender a cuidar da sua Saúde Mental e do das pessoas com quem convivemos e nos relacionamos”, recomenda Arthur.
Janeiro Branco é a maior campanha do mundo em prol da construção de uma cultura da Saúde Mental na humanidade. Surge para tornar realidade o ideal de um mundo mais saudável em relação a tudo o que diz respeito à subjetividade dos indivíduos. “E o “Hiato” vem para somar forças a este movimento”, ressalta Andréa Alfaia.
O Brasil registrou 11.433 mortes por suicídio em 2018, um caso a cada 46 minutos. O número representa um crescimento de 2,3% em relação ao ano anterior, quando 11.178 pessoas tiraram a própria vida (dados de 2018 do Ministério da Saúde).
O movimento ascendente nos números no mundo, aponta que a epidemia é global. No planeta, a cada 40 segundos acontece um suicídio – e para cada suicido há, pelo menos, três tentativas. O Brasil é o oitavo país com mais casos no mundo. Homens indígenas adultos, crianças e jovens de 10 a 19 anos e homens adultos entre 35 e 55 anos lideram este ranking alarmante.
“Sabemos que ocupar-se com questões de morte e suicídio significa violar tabus”, pontua o dramaturgo Arthur Tadeu Curado. Em Hiato, este assunto é abordado com muito cuidado. “Sabemos do teor polêmico do tema e estamos trabalhando para suavizar a linguagem e transformar em poesia e arte”, ressalta Arthur.
A montagem parte de uma investigação da alma humana. Material psicológico que qualquer limite imposto poderia implicar em deixar de fora uma parte importante. “Por isso, investigamos trabalhos científicos e muito da literatura especializada. Pesquisamos pontos de vista da sociologia, teologia e da medicina e transformamos em ação, palavras, luz e sombra”, explica o dramaturgo.
“Quem não viveu alguma espécie ‘hiato’, de crise ou pelo menos algum momento muito tenso de 2016 para cá?’, questiona Arthur Tadeu Curado. Para a atriz Larissa Salgado, seu hiato “acontece junto com a maternidade. É importante falarmos sobre a quantidade de mães recentes adoecidas, não pela gestação ou pelo parto, mas pelas bruscas transformações físicas, neuronais e hormonais que precisamos atravessar. E o pior é que não temos nem a chance de estarmos desequilibradas, pois afinal, a maternidade ainda hoje é vista como o ápice da vida de uma mulher. A realidade nem sempre é tão bonita assim”.
Em Hiato, há uma personagem trans que, superado o processo de ressignificação de gênero, encontra-se num deserto afetivo. Um homem ansioso, superidentificado com sua carreira e status, narra seu processo depressivo após sofrer da síndrome de burnout. Uma mãe, com um bebê pequeno, divide suas primeiras impressões com a maternidade. Um ator, que opta por um trabalho ao invés de acompanhar o processo de morte da própria mãe e precisou lidar com as sequelas da decisão. Uma mulher, sob cuidados paliativos, que convida seu parceiro a acompanha-la em sua eutanásia. E há também uma personagem que representa a “família sobrevivente” depois que seu marido decide desistir de estar por aqui.
Serviço:
Local: Sala Multiuso do Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul)
Temporada: de 31 de janeiro a 09 de fevereiro
Horários: Sextas e sábados, às 20h; e domingos, às 19h
Classificação Indicativa: 16 anos
Duração: 50 minutos
Ingressos: R$ 40,00 (inteira) e R$ 20,00 (meia-entrada)